doi 10.4067/S0718-83582015000300007

 

O processo de apropriação da casa: separando o deslumbramento da satisfação1

The housing appropriation process: establishing differences between fascination and satisfaction1

 

Gabriela Morais Pereira2, Carolina Palermo3

2 Brasil. Arquiteta e Urbanista, doutora da Universidade Federal de Santa Catarina, professora adjunta Universidade do Estado de Santa Catarina.

3 Brasil. Arquiteta Universidade Federal de Pernambuco, Mestre em Arquitetura Escola de Engenharia de São Carlos/USP, Mestre em Architecture École Darchitecture de Nancy/França e Doutora em Sciences Phisiques Université de Metz/França. Professora voluntária da Universidade Federal de Santa Catarina.


Resumo

O ensaio trata da satisfação residencial em unidades produzidas por programas de governo no Brasil. Satisfação residencial é decorrente do processo de apropriação da casa e ocorre nos primeiros anos de ocupação de um novo espaço de moradia. Apropriar-se significa dotar a moradia de significados e representações que dizem respeito, mais do que às dimensões físicas e ao atendimento das necessidades programáticas, aos aspectos simbólicos relativos ao bem estar, pertencimento e identidade. Tais percepções recebem interferência direta do que ocorre já nos primeiros meses de ocupação, com sentimentos que podem ir do deslumbramento (quando a nova casa é percebida como melhor – mesmo que não o seja de fato – que a anterior) ao choque (quando a nova casa é percebida como pior – mesmo que não o seja de fato – que a anterior). Saber isolar o eco do deslumbramento ou choque na opinião do morador a respeito de sua nova moradia é vital para o pesquisador identificar o potencial de adequação do espaço à família usuária e a real medida da satisfação expressa. O artigo inclui estudo de caso realizado junto a moradores de conjuntos produzidos por programas federais nos últimos 04 anos no Estado de Santa Catarina, Brasil.

PALAVRAS CHAVE: ARQUITETURA; HABITAÇÃO SOCIAL; APROPRIAÇÃO ESPACIAL; SATISFAÇÃO RESIDENCIAL.


Abstract

This paper analyzes residential satisfaction within the context of the housing units developed by the Brazilian State. Residential satisfaction is the culmination of the housing appropriation process and occurs during first years of the occupation of a new space. The concept of appropriation means providing new dwellings with meanings and representations related to the symbolic aspects of welfare, belonging and identity, thus transcending physical and satisfaction aspects. These perceptions are directly affected during the first months of the occupation as the result of emotions ranging from fascination (the new housing unit is regarded as better than the previous dwelling when in fact it is not) to great disgust (the new housing unit is regarded as worse than the previous dwelling when in fact it is not). Isolating feelings such as novelty or disgust from the opinion of users would enable researchers to identify the adaptation potential of spaces in relation to families and estimate real satisfaction levels. This paper includes a case study conducted in the housing developments built by the State in Santa Catarina, Brazil, over the last four years.

KEYWORDS: ARCHITECTURE; SOCIAL HOUSING; SPATIAL APPROPRIATION; RESIDENTIAL SATISFACTION.


 

A aquisição de uma moradia envolve diversos fatores, desde motivações para compra (estágio do ciclo de vida, acesso a crédito entre outros) até requisitos e atributos que influenciam na escolha da moradia (localização, preço, área construída, serviços agregados, pontos de interesse etc.). Tudo isso considerando aqueles que têm acesso ao mercado privado. Quando o usuário é o de menor renda, quais fatores estão envolvidos nesta relação?

As famílias de menor renda, dependentes de programas públicos de provimento habitacional, não têm alternativas. Ao serem contempladas, caso declinem do "prêmio", voltam ao processo e podem ter que esperar muitos anos por uma nova oportunidade.

A despeito do não tratamento dos espaços públicos dos conjuntos, do inadequado caráter condominial (transferindo para os moradores o ônus da manutenção desta parcela da cidade), da localização recorrente em zonas periféricas (desconectando os moradores da própria cidade) e das unidades diminutas que consideram um apartamento padrão (e provavelmente uma família padrão), boa parte dos estudos já realizados para verificar o impacto desses espaços na vida das famílias identifica um elevado índice de satisfação dos usuários em relação às unidades habitacionais.

Este artigo aborda o processo de apropriação da casa, de maneira a compreender a dicotomia existente entre o elevado grau de satisfação expresso pelos moradores de conjuntos habitacionais populares, e a real qualidade destes conjuntos.

 

Qualidade arquitetônica

A habitação exerce papel fundamental enquanto estratégia de inclusão social por ser referencial de proteção, propriedade, espaço privado e singular onde a pessoa, junto à sua família, tem liberdade e condições de expressar sua cultura, crenças e anseios e definir seu território, construindo sua identidade na sociedade em que vive.

A Habitação de Interesse Social é comumente entendida como aquela provida de forma pública ou privada e destinada a usuários com renda familiar até 5 SM4. No entanto, é necessário o entendimento da HIS enquanto elemento físico, social e simbólico com requisitos que vão desde oferecer acesso, abrigo e permanência5, passando por uma diferenciação entre os conceitos de casa enquanto invólucro que divide espaços externos e internos, moradia quando se identifica com o modo de vida de seus usuários e habitação quando interagindo com os elementos que o espaço urbano oferece6.

O conceito de qualidade da habitação na HIS envolve portanto: a) a qualidade arquitetônica, construtiva e ambiental da casa; b) a qualidade social da moradia e, c) a qualidade urbanística da habitação, devendo ser percebida nas diferentes abordagens, de acordo com os agentes envolvidos em cada uma delas.

A especialização do objeto casa acontece, sobretudo, pelos significados incorporados por seus moradores. O homem organiza o espaço de acordo com suas necessidades biológicas e relações sociais7. Após um tempo de permanência e da familiaridade construída, vem o apego, atribuindo-se uma relação de valor, e este espaço se transforma em um lugar, ganhando importância no reconhecimento do indivíduo enquanto ser social. A construção de apego ao lugar é inerente aos vínculos estabelecidos entre o indivíduo e o local de permanência, coexistindo portanto com a ideia de lar e por vezes desejado em outros espaços como os de trabalho8.

Ao considerarmos as relações entre o indivíduo e a habitação, da adequação às necessidades biológicas, psicológicas, físicas, sociais e culturais às condições que o espaço construído e seu entorno oferecem para tal; o esforço e comprometimento financeiro empenhados e o tempo de vinculação "forçada" pelas regras de financiamento, a condição de apropriação passa a ter uma importância ainda maior, a ponto da ‘casa própria’ ser vista – e usada como veículo de propaganda política – como uma pré-condição para a plena cidadania e assim ocorre, no Brasil, mesmo que o cidadão não possa arcar com os custos de manutenção e reparo que a edificação vai requerer já nos primeiros anos da fase de uso.

Todo esse panorama precisa estar contemplado na verificação da qualidade do espaço habitacional também pelo viés do morador, podendo ser confirmada por elementos objetivos como funcionalidade, qualidade construtiva, entre outras, e por elementos subjetivos como a geração de valor e apego, como dito. Dentre os elementos subjetivos, aquele que pode oferecer uma leitura mais rica da relação morador/moradia é a satisfação residencial.

 

Satisfação residencial

A satisfação residencial envolve fatores interdependentes e não pode ser entendida apenas por uma das facetas da qualidade residencial. Decorre do processo de apropriação da casa que ocorre nos primeiros anos de ocupação de um novo espaço de moradia. Apropriar-se significa dotar a moradia de significados que vão beneficiar a sensação de bem estar, pertencimento e identidade.

Tais elementos recebem interferência direta do que ocorre já nos primeiros meses de ocupação, com sentimentos que podem ir do prazer ou deslumbramento ao desapontamento ou choque, resultantes da comparação entre o desempenho percebido de um produto9 (casa nova) em relação a outro (antiga casa), e isso vai mudar a forma como ele percebe o novo espaço. A percepção no curto prazo fica assim condicionada a essas primeiras sensações, podendo criar uma falsa satisfação ou insatisfação. Saber isolar o eco do deslumbramento ou choque na opinião do morador a respeito de sua nova moradia é vital principalmente para o pesquisador que quer identificar o potencial de adequação do espaço à família usuária e a real medida da satisfação expressa.

Na produção pública da habitação coexistem os interesses, por vezes conflitantes, de promotores, projetistas, executores e tantos outros agentes, que sempre perdura a dúvida sobre como conciliar tantos critérios de qualidade e ainda considerar as necessidades objetivas e subjetivas do morador – aqui entendido como o usuário final.

Talvez o conceito de satisfação residencial acima não seja o mais apropriado, ou os elementos envolvidos na sua identificação não estejam sendo verificados de forma objetiva. Mais adequados talvez sejam os conceitos da psicologia ambiental que trata do comportamento humano em sua interação com o meio. Tais conceitos pressupõem a existência de algo (um desejo, por exemplo) a ser satisfeito10. Tal concepção incorpora a inter-relação entre a pessoa em seu contexto cultural, e o meio onde se insere. Desta forma, "cada pessoa percebe, avalia e tem atitudes individuais em relação ao seu ambiente físico e social"11. Satisfação residencial enfim talvez não seja o resultado da comparação entre a nova e a antiga casa e sim o resultado do atendimento ou não a um desejo (ou expectativa) pela nova casa, independentemente à situação de moradia anterior.

Satisfação residencial, portanto, é uma resposta individual, emocional e cognitiva a um foco particular (casa), em um tempo específico, a partir de uma atitude tomada por cada morador, revelando valores positivos ou negativos relativos à casa.

Para compreender melhor os conceitos tratados é importante delimitar quais fatores definem a satisfação residencial e em quais níveis podem ser abordados, da escala micro do cômodo, passando pela interface do edifício e do conjunto, à escala macro do bairro e da cidade.

A satisfação residencial é ainda explicada ou influenciada por três grupos de fatores12:

a. Aqueles relacionados às características dos indivíduos e do agrupamento familiar, como composição familiar, estágio do ciclo de vida, necessidades físicas individuais entre outros;

b. Os relacionados à natureza e qualidades intrínsecas dos espaços residenciais enquanto objeto, como área útil disponível, funções a serem atendidas, dinâmica de uso etc. e;

c. Aqueles vinculados aos processos relacionais dos indivíduos com seu contexto residencial como história familiar, códigos de conduta e cultura doméstica, por exemplo.

Alguns conceitos devem ainda ser considerados na definição da satisfação residencial. São eles13:

O espaço físico define a escala de compreensão do espaço que dominamos. Quando estamos em um espaço pequeno ou restrito, nos comportamos diferentemente de quando lidamos com espaço amplo ou liberto, e isso tem a ver com limites físicos do espaço – mais estreito ou mais baixo, por exemplo – ou às restrições comportamentais – uma escola, um parque, uma cadeia, um shopping – locais que "definem" um padrão atitudinal.

A dimensão temporal, considerada no sentido subjetivo do termo – tempo horizontal. O tempo horizontal diz respeito à percepção do tempo pelo sujeito, e seu lugar nesse tempo: estou velha, nova, há muito tempo moro aqui, morei pouco tempo lá. Este tempo tem representações distintas para cada usuário: 05 anos para quem tem 25 pode ser muito para fazer uma viagem, ou pouco para casar e ter filhos, assim como morar por 5 anos em um lugar pode ser muito ou pouco, dependendo do quanto se gosta ou não de estar ali.

A identidade local pode ser entendida como "uma estrutura complexa constituída por atitudes, valores, crenças e significados referentes à relação que estabelecemos com os espaços físicos"14. Diz respeito ao significado que os lugares têm para cada pessoa e não apenas uma identificação pura e simples.

A intricada relação existente entre o ambiente, como o meio que oferece condições materiais, culturais, sociais e éticas ao pleno desenvolvimento do homem como ser, e este indivíduo como transformador, mas ao mesmo tempo sendo influenciado ou condicionado pelo ambiente, dá o sentido de território, apego, apropriação, significação, podendo – o ambiente – ser visto sob dois aspectos: o físico (arranjo espacial, qualidade lumínica, sonora e térmica, dentre outros) e o não-físico (desejos, experiências anteriores, padrões de comportamento, autoestima, etc.).

Introduzindo o olhar do morador e buscando entender a satisfação residencial como resultado de um processo e não um produto, propomos uma abordagem por categorias de apreensão, identificadas no contato com usuários de conjuntos habitacionais produzidos nos últimos 04 anos em Santa Catarina, Brasil.

1ª categoria: surgem expectativas de ocupação baseadas em desejos e possibilidades de realizações individuais.

"Assim que eu recebi a ligação lá da prefeitura já fiquei sonhando. No final de semana fui lá na loja [...] e comprei um conjunto de quarto lindo. Nem tinha visto o apartamento, mas já comprei porque era aquele que eu queria. Na hora que o pessoal entregou, não coube... tive que trocar tudo porque não conseguiram montar [os móveis] lá no quarto, era muito pequeno." 15

2ª categoria: a vontade expressa de tomar como seu o novo espaço envolve uma clara avaliação e hierarquização das necessidades domésticas

"A gente teve que ver certinho o que dava pra [sic] trazer e o que precisava comprar novo. Minha irmã veio morar com a gente pois ficava mais fácil pra [sic] ela ir pro [sic] trabalho, mas daí não dava pra [sic] ela ter um quarto só pra [sic] ela. Preferimos a beliche [sic] porque não dava pras [sic] meninas brincarem na sala e também porque eu não queria a casa bagunçada".

3ª categoria: com base na necessidade maior ou menor de territorialidade e considerando a dimensão simbólica que envolve o repertório sociocultural dos indivíduos bem como suas experiências anteriores, acontece a ocupação por ação e transformação.

"Ah não, [no] final de semana a casa fica cheia. Entre os filhos, noras e genros, amigos...são 20 pessoas. Não tem como ficar todo mundo só na sala. Se espalha gente por todo lado, no quarto, na área de serviço, até no corredor fica gente conversando em pé. O que importa é tá [sic] todo mundo junto"

4ª categoria: o espaço ganha significados pela interação cotidiana, surgindo a ocupação por identificação simbólica.

"O nosso quarto é o único lugar que [onde] as meninas não podem entrar. Lá na casa da minha sogra nós éramos 9 dividindo 2 quartos, então lá [o quarto] é o nosso ninho, um espaço só nosso".

5ª categoria: aqui se instala o apego ao lugar, como meio para manutenção do status até que mudanças no indivíduo e em suas necessidades encontrem meio propício para a busca por novos lugares.

"tem os problemas e tal, mas [isso] aqui é nosso, né?"

Salienta-se que as categorias não são sequenciais. O caráter subjetivo do processo de construção do apego ao lugar altera a ordem de prioridades e a adequação destas prioridades às condições oferecidas pelo meio físico e sociocultural.

No caso tratado em campo, após este processo inicial de ocupação a casa passa a ser moradia, passando a ser reconhecida como lar e "nos ofendemos se um estranho a critica"16. Assim, do ponto de vista do pesquisador, uma forma de identificar a satisfação residencial deveria considerar a ponderação dos dados obtidos junto aos moradores e a complementação desses dados através de leitura técnica crítica e objetiva, afim de que um momento de deslumbramento do entrevistado, por exemplo, não encubra potenciais inadequações ainda não percebidas, mas que poderão em breve impactar negativamente o modo de vida familiar ou suas necessidades, por vezes culminando na rejeição desta moradia.

 

Identificação da satisfação residencial

A identificação e avaliação da satisfação residencial tem sido objeto de estudo de diferentes autores que concordam com a necessidade de utilização de procedimentos multi-métodos que considerem a manifestação do usuário a respeito de sua própria moradia. Os métodos e técnicas a serem adotados devem ser definidos17 conforme a resposta humana procurada e o modo de atuação do pesquisador. Assim, os métodos irão variar se a investigação diz respeito a comportamento, percepção e cognição, sentimentos e emoções ou atitudes, preferências, aspirações e/ou expectativas.

Retomando uma visão mais abrangente, cabe destacar a importância18da compreensão sobre a inserção da relação homem/ambiente tratada em sistemas mais amplos como os sociais, econômicos, políticos e culturais. Mais que a escolha e adoção de multi-métodos, importa a complementaridade de tais métodos, levando em conta a possível deturpação das informações levantadas junto aos usuários.

Em um questionário a ser aplicado a moradores, por exemplo, uma pergunta como "você considera o espaço da sala bom ou ruim?" envolve um rápido julgamento a respeito da adequação ou inadequação física do espaço para a realização de determinadas atividades, não necessariamente verbalizadas. Que atividades seriam? A questão foi entendida tal qual imaginava o pesquisador? Afinal, esse espaço pode ser entendido como bom ou ruim por ter uma vista agradável ou desagradável; por ter boas ou más condições de insolação e ventilação; por ser melhor ou pior que a sala da moradia anterior, enfim, por diferentes características, relativas a diferentes aspectos da qualidade espacial. Uma pergunta complementar como "o que torna este espaço bom ou ruim?" pode ajudar. Assim, uma entrevista semiestruturada pode facilmente elucidar eventuais dúvidas e promover um melhor entendimento sobre a leitura que o morador faz a respeito do espaço em questão.

Obviamente, a necessária contextualização do morador logo no início da entrevista vai permitir ao pesquisador identificar a construção ou não de uma percepção da satisfação por parte deste entrevistado. Importam a caracterização sociocultural do indivíduo e da família e seu percurso residencial, dados que vão elucidar e complementar as informações expressas sobre a dinâmica de uso do espaço doméstico.

Assim, é possível verificar se o citado espaço da sala é adequado às atividades presumidas, mas também se é adequada á rotina daquela família específica. Ex.: quando, em uma visita exploratória, observa-se grande quantidade de brinquedos espalhados na sala, sendo que a moradora relata "o quanto gosta de vigiar as crianças quando está na cozinha", este seria um indício de que o projeto concebido, no que concerne o conjunto integrado sala/cozinha, facilitou a rotina doméstica naquele estágio da vida familiar, mas não significa que facilitará as rotinas em estágio de vida subsequente.

Para cada um dos procedimentos adotados: entrevista semiestruturada, registro fotográfico, mapeamento funcional etc., corresponderão elementos e critérios próprios tanto de identificação quanto de registro. O importante é elencar os critérios a serem verificados e qual o peso de cada um na definição da satisfação residencial, sempre fazendo o contraponto entre a análise relativa ao depoimento do usuário e aquela relativa ao próprio ambiente.

Para alguns estudiosos a qualidade interna da unidade é o critério preponderante na satisfação dos moradores. Entretanto, em se tratando de habitação de interesse social, importa a essência da função habitacional, aquilo a que se pode reduzir como condição mínima de utilidade, possibilitando apropriação, significação e apego. O projeto competente seria portanto aquele que garante a satisfação residencial com economia e racionalização de recursos.

 

Conclusão

A satisfação do usuário em relação à casa não passa apenas por uma leitura do quanto este espaço atende às expectativas iniciais do morador ou de seu desempenho edilício. Envolve igualmente uma série de processos e percepções como apropriação, identidade, território, sensação de pertencimento e tantos outros que extrapolam a disciplina da arquitetura.

A apropriação do espaço da casa e a dotação do caráter de lugar, desde o desejo do espaço, a leitura deste espaço com base em experiências e repertório sobre o ato de morar, a percepção da forma como este espaço pode ou não atender às necessidades imediatas e futuras daquela família, o esforço de moldar-se e adaptar-se às diferentes possibilidades de uso até a efetiva apropriação daquela moradia, é um longo caminho e este processo diminui o senso crítico do morador no momento de identificar eventuais problemas enfrentados. É preciso que decorra certo tempo até que a experiência habitacional, agora em condição estável, permita certo afastamento e autorize ao morador a de fato identificar problemas e virtudes da moradia, malefícios e benefícios das soluções.

A análise da qualidade do espaço doméstico como objeto arquitetônico envolve certamente uma abordagem multicritério e multidisciplinar. Entretanto, a ponderação das informações colhidas junto aos moradores relativamente à resposta do espaço como cenário da vida familiar, é fator a ser levado a sério.

Tal abordagem não torna a análise superficial tampouco ignora o usuário como agente do espaço, simplesmente confirma o que autores já afirmaram e demonstraram: é mais fácil prever em projeto o bom funcionamento de um lugar a partir da apreensão das atividades que ali presumidamente irão se desenvolver do que a partir da compreensão a respeito daqueles que irão presumidamente ocupar os espaços projetados.

 

Notas

1 O estudo é parte de investigação de doutorado da autora.
4Salário Mínimo - Menor valor que o empregador pode pagar ao empregado. Em Dez/2014, equivalia a USD 296,72
5Turner, 1977.
6Martucci, 1990.
7Tuan, 1983.
8Elali e Medeiros, 2011.
9Kotler e Keller, 2006.
10Gärling e Friman, 2002.
11Moser, 1998, p.121.
12Freitas, 2004.
13Moser, 1998.
14Nunes, 2010.
15Depoimentos coletados junto a moradores em pesquisa de campo para desenvolvimento de tese de doutorado. Entrevistas ocorridas entre Maio e Junho de 2013 em conjuntos do Programa Minha Casa Minha Vida , do Governo Brasileiro, lançados em 2010 na cidade de Joinville, Estado de Santa Catarina, Brasil.
16Tuan, 1983, p.160.
17Elali e Pinheiro, 2013.
18Campos-De-Carvalho, 2011.

 

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Recibido: 30-09-2014

Aceptado: 05-06-2015