doi 10.4067/S0718-83582014000200004

 

As novas dinâmicas da sustentabilidade urbana em territórios de pobreza e exclusão social: o caso da Cova da Moura

New dynamics of urban sustainability in areas of poverty and social exclusion: the case of Cova da Moura1

 

Marco Pais Neves dos Santos1

1 Portugal. Licenciado em História e Geografia e Planeamento Regional, Universidade Nova de Lisboa. Mestrado em Cidadania Ambiental e Participação, Universidade Aberta. Doutorando em Desenvolvimento Social e Sustentabilidade, Universidade Aberta. Direção de Qualificação e Licenciamento, Instituto da Construção e do Imobiliário (InCI).


Resumen

Durante a segunda metade do século XX verificaram-se vários fluxos migratórios direcionados à periferia da cidade de Lisboa, para os quais nem a habitação social do Estado, nem o mercado de habitação de investimento privado, conseguiram dar resposta em quantidade e qualidade à carência imobiliária. Os fluxos que mais acentuaram estas carências foram a chegada de emigrantes e o regresso dos retornados após a independência dos países africanos de expressão portuguesa entre 1975/76. Estes fluxos levaram à construção de muitos bairros de barracas e habitação clandestina, desordenados, pouco sustentáveis, de que é exemplo o Bairro da Cova da Moura, no concelho da Amadora. Como noutros bairros deste tipo, gerou-se um conjunto de questões sociais negativas, como a criminalidade, a pobreza e a exclusão, bem como carências na educação, saúde, higiene e alimentação. Este trabalho enfatiza o trabalho desenvolvido pela Associação Cultural Moinho da Juventude (ACMJ), na defesa e representação da comunidade, onde nos últimos tempos se implementou um conjunto de projetos que visam a sustentabilidade social, económica e ambiental do bairro. Comprovamos ser possível passar de um espaço isolado e marginalizado para um espaço apreciado pelo valor sociocultural, gastronómico e medicinal, valendo-se de um mercado turístico especializado (coétnicos).

PALABRAS CLAVE: COVA DA MOURA; SUSTENTABILIDADE URBANA; POBREZA E EXCLUSÃO; INTEGRAÇÃO SOCIAL E EDUCACIONAL


Abstract

During the second half of the twentieth century, migration flows concentrated in the outskirts of Lisbon resulted in a housing shortage that neither the social housing provided by the State nor the private housing market was able to solve in terms of quality and quantity. The arrival of immigrants and returnees following the independence of Portuguese-speaking countries in 1975/76 further aggravated this shortage. These migration flows led to the development of a series of uncontrolled and unsustainable neighborhoods formed by slums and illegal houses, one example being the Cova da Moura at the municipality of Amadora. Like other similar neighborhoods, Cova da Moura saw the emergence of a series of social problems such as crime, poverty, social exclusion and shortcomings in the fields of education, health, hygiene and nutrition. This paper emphasizes the work carried out by the Youth Mill Cultural Association (ACMJ) in defending and representing the community, where several projects aimed at promoting the social, economic and environmental sustainability of the neighborhood have been implemented over the last years. It is also demonstrated that a specialized tourist market (co-ethnic) can turn an isolated and marginalized area into a space that is appreciated for its sociocultural, culinary and medicinal values.

KEYWORDS: COVA DA MOURA; URBAN SUSTAINABILITY; POVERTY AND EXCLUSION; SOCIAL AND EDUCATIONAL INTEGRATION


 

Introdução

“a maior glória de viver não está em jamais cair, mas em levantarmo-nos cada vez que caímos”.

Nelson Mandela (1918-2013)

 

A humanidade caminha em direção a um mundo marcado por uma urbanização generalizada. Tal afirmação fundamenta-se no crescimento da população mundial verificado em áreas urbanas, e também na centralidade que os centros urbanos possuem nos processos económicos, políticos, sociais e culturais da vida contemporânea2.

Em Portugal, o processo de expansão do espaço urbanizado, que é um fenómeno do século XX e está intimamente associado à macrocefalia lisboeta3, teve uma evolução insuficiente e desordenada a partir dos anos 50, devido ao intenso êxodo rural para as cidades, em 1975/76, com o regresso a Portugal de cerca de meio milhão de retornados, provenientes das ex-colónias africanas4, e a partir de meados dos anos 80, através de um elevado número de imigrantes oriundos dos PALOP5.

Foi sobretudo em 1975/76, com o regresso em massa dos retornados e de imigrantes dos Países Africanos de Expressão Portuguesa, que se manifestou a insuficiência do mercado de habitação privada e a incapacidade do Estado na atribuição de habitação social. Daí resultou um forte mercado paralelo em resposta às emergentes necessidades de habitação, proliferando bairros de barracas e habitação clandestina, de que é exemplo o Bairro da Cova da Moura, no concelho da Amadora na periferia de Lisboa6.

A facilidade com que se podia levantar uma barraca em qualquer lugar, sem qualquer respeito por princípios do ordenamento jurídico, disciplinadores do comportamento humano promotores da a harmonia, da segurança e da paz social, foi em tudo semelhante à inércia do Estado no combate a esta construção clandestina. O próprio Estado promoveu a construção clandestina, de diversas formas, nomeadamente através da organização de loteamentos onde as famílias carenciadas construíam uma barraca e pagavam uma renda mensal pelo terreno, como aconteceu nos anos 60 em Lisboa7, ou favorecendo os promotores imobiliários e os grandes empreiteiros nas zonas urbanas mais valorizadas8. E quando não a promoveu, não teve a astúcia necessária para a controlar, mostrou passividade e inércia, e muitas vezes desinteresse na resolução dos problemas habitacionais9. Atuou como uma espécie de “Estado-centauro” (guiado por uma cabeça liberal sobre um corpo autoritário), preocupando-se apenas com a contenção da desordem provocada pela exclusão social.10 As autarquias podem efetivamente ser responsabilizadas pelo crescimento desmedido e degradação incontrolável destes bairros, tristemente célebres pelas piores das razões: pobreza, tráfico de droga e violência11.

Devido à proximidade da cidade de Lisboa, o concelho da Amadora recebeu uma grande parte destes bairros considerados problemáticos, de que são exemplo, Quinta da Lage, Reboleira, Azinhaga dos Besouros, Estrela de África (Venda Nova), Bairro 6 de Maio (Damaia), Boba, Estrada Militar do Alto da Damaia, Bairro de Santa Filomena, Serra da Mira, Portas de Benfica e Alto da Cova da Moura.

Estes bairros são considerados pela sociedade como áreas desordenadas e insustentáveis, de não-direito, de subversão social, habitados e frequentados por dissidentes, onde imperam a criminalidade, a droga e a violência12. Contudo, os residentes da Cova da Moura têm vindo gradualmente a mudar a opinião pública, adotando um modelo de vida sustentável, honesto e respeitável, autossuficiente e criativo, empreendedor e dinâmico, de matriz cultural.

Sem querer desviar o foco da população, a grande responsável pela mudança, é necessário salientar que quando se fala no caminho da sustentabilidade seguido pelos habitantes da Cova da Moura, está-se obrigatoriamente a falar da Associação Cultural Moinho da Juventude (ACMJ), uma Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS), constituída pela população, que trabalha dentro da comunidade, e para a comunidade, que representa, promove, educa e forma, incentiva e fomenta o progresso, e proporciona à comunidade ferramentas para exprimir as suas capacidades e competências, procurando em conjunto o rumo a seguir, fazendo a diferença. O trabalho da população, sob a organização da ACMJ, tem sido muito importante para mudar a opinião da sociedade civil acerca do bairro, mitigando o estigma social de que a comunidade é alvo, através de um vasto conjunto de atividades e eventos de cariz cultural, que promovem a sustentabilidade ambiental e financeira dinamizando o comércio etnocultural, combatendo a pobreza e a exclusão, caminhando com passos largos em relação aos desígnios do Desenvolvimento Sustentável.13

Mas não podemos ser injustos e esquecer o trabalho que outras instituições ou organismos têm vindo a realizar neste espaço de exclusão só porque não têm a mesma visibilidade. Assim, cabe aqui destacar o trabalho da Associação de Moradores do Bairro Alto da Cova da Moura, que no fim dos anos 80 (do século XX) orientou a planificação das ruas, a instalação de água canalizada, esgotos e eletricidade no bairro, da Associação Clube Desportivo do Alto da Cova da Moura, fundada em 1980 por um grupo de portugueses vindos da Angola, e aceite em 2001 como IPSS, muito importante na promoção da união, da partilha e do convívio, gerando a estabilidade necessária aos habitantes de um bairro de futuro incerto, e do Centro Infantil S. Gerardo - Centro Social e Paroquial N.ª Sr.ª Mãe de Deus da Buraca, pelo apoio social, fazendo muito com pouco14. Cabe aqui expedir o mesmo reconhecimento à Câmara Municipal da Amadora, por via do seu Gabinete Local, onde diariamente técnicos altamente qualificados ajudam a comunidade, ainda que, ao nível da decisão política, a sua atuação perante o Bairro tenha sido muito oscilante ao longo dos anos, ou até mesmo desleixada, nomeadamente no que se refere às negociações com os proprietários dos terrenos, o que dificultou a requalificação do bairro. Não tão diretamente, este reconhecimento pode ser estendido a uma enorme diversidade de entidades, como a Associação dos Amigos da Damaia, entre outros.

É sobre o caminho positivo e sustentável que os residentes deste bairro têm perseguido ao longo, reunidos em torno da ACMJ, que incide o presente trabalho, no âmbito da Sustentabilidade Urbana em Territórios de Pobreza e Exclusão Social. Destacam-se metodologias empreendedoras (de fins educacionais, culturais, ambientais e económicos) que foram implementadas de forma responsável no Bairro da Cova da Moura, que impediram a demolição do bairro por interesses de especulação imobiliária, permitiram dinamizar o espaço de forma positiva, mantendo-o fiel às origens dos seus residentes, e promoveram uma melhor qualidade de vida do ponto de vista formativo, financeiro, cultural e social. Este facto permite a outros territórios marginalizados acreditar que é possível aplicar um modelo semelhante para a renovação de outros espaços.

 

A sustentabilidade urbana – um percurso de consciencialização

A abordagem à Sustentabilidade Urbana, na perspetiva da responsabilidade individual e coletiva dos habitantes da Cova da Moura, muito centrados em torno da ACMJ, torna necessário definir o que é, qual a sua importância, como tem evoluído, as suas múltiplas dimensões, e quais os debates teóricos na atualidade sobre o tema.

O que se entende por Sustentabilidade Urbana? Segundo Maclaren15, não há uma definição única de sustentabilidade urbana, ainda que existam alguns indicadores ambientais que são transversais a todas as comunidades, porque cada espaço urbano tem uma conceção própria, que desenvolve com base nas suas condições económicas, ambientais, sociais e juízos de valor. Ainda assim, apesar de assumir formas distintas consoante o seu contexto geográfico, a urbanização é um fenómeno generalizado à escala mundial.

Considerando as particularidades do espaço em estudo, “uma cidade é sustentável na medida em que é capaz de evitar a degradação e manter a saúde de seu sistema ambiental, reduzir a desigualdade social, prover seus habitantes de um ambiente construído saudável, bem como estabelecer pactos políticos e ações de cidadania que o permitam, e enfrentar desafios presentes e futuros”16. Esta definição, uma de muitas possíveis, para além de ser adequada à realidade local, inclui vários indicadores transversais a todas as comunidades17, já que uma cidade será tanto mais sustentável, quanto mais conseguir integrar de forma satisfatória as questões sociais, económicas, ambientais e culturais, e mais promover o diálogo construtivo e empreendedor junto dos seus habitantes.

E porque é tão importante? O planeamento dos espaços de habitação comum ou social no seu todo e das cidades, afinal é uma prática ancestral, ainda que nem sempre recorrente. Atestam-no, entre outros exemplos possíveis, as plantas romanas de urbe, as quais sendo estabelecidas a partir de dois eixos principais (cardo e decumanus) procuravam exponenciar a articulação entre uma estética monumentalista e um construtivismo pragmatista. Séculos depois, os burgos medievais, não raras vezes amuralhados, sempre se corporizavam subordinadamente à importância e dimensão dos templos religiosos – ainda que pudesse ser tal mais simbólica, espiritual, que política propriamente18. Estes dois exemplos provam que, se ao longo do tempo se sucedem as gerações e se vão renovando as comunidades humanas, e se a par se muda o planeamento dos espaços, algo há que se mantém: a necessidade, básica, de existir e de se fazer criteriosamente esse mesmo planeamento, ainda que agora seja cada vez mais exigente. A cidade tornou-se no suporte espacial da vida humana, organizada em sociedade, responsável por 52% da população mundial, valor que se espera aumentar para 60% em 203019.

As cidades desempenham um papel vital no desenvolvimento social e económico dos países, e são parte da sua matriz histórica e cultual. Quanto melhor planeadas e organizadas, mais eficientes e produtivas, e mais contribuem para a sustentabilidade, o que por sua vez vai gerar recursos que podem ser investidos em infraestruturas de saúde e educação, de beneficiação ambiental, e em projetos para melhorar as condições de vida, reduzir pobreza e assimetrias sociais20. As políticas públicas de desenvolvimento e planeamento inadequadas, e a gestão urbana ineficaz, levam à degradação ambiental, social e económica, e ao prejuízo cultural. No momento, em resultado do crescente aumento da população urbana, as carências de planeamento que se verificam nas cidades assumiram proporções calamitosas, sobretudo devido a problemas: (i) ambientais – poluição atmosférica, aumento das áreas impermeabilizadas, destruição de solo agrícola (classe A, B e C), aumento da área construída, efluentes domésticos e industriais, tratamento dos resíduos sólidos urbanos, menor quantidade de água potável disponível, aumento do consumo energético, degradação dos ecossistemas, circulação automóvel, e alteração definitiva e destruidora da paisagem natural21; (ii) sociais – pobreza, fome, desemprego, delinquência, insegurança, confrontos intergerações, idosos solitários e desamparados, transtornos afetivos/autoestima, e sociedades muito envelhecidas22; (iii)económicos – cultura do esbanjamento, distribuição desproporcional da riqueza, grandes disparidades remuneratórias, consumismo, materialismo, individualismo e ausência de uma cultura de partilha23; (iv)saúde – transtornos alimentares (anorexia, bulimia, obesidade), alimentação e cuidados de saúde deficitários, violência doméstica, doenças infecto-contagiosas, situações clínicas depressivas, e perturbação de stress pós-traumático24; e (v) culturais – confrontos étnicos, descriminação a minorias éticas, intolerância religiosa, racismo e xenofobia25. Sem se pretender esgotar o tema, estes são alguns dos problemas que assumem maior notoriedade na gestão da cidade, reclamando uma alteração de paradigma capaz de contribuir para a sustentabilidade urbana.

A cidade como ecossistema deve ser encarada como um recurso, muito importante, no contexto do qual ocorrem complexas interações Homem-Ambiente, com estruturas em permanente reajuste dinâmico, onde a implementação de um processo de sustentabilidade se aplica com maior premência e legitimidade26. Por outro lado, a cidade também é a unidade ótima de análise para entender os desequilíbrios urbanos que afetam o mundo moderno, em termos arquitetónicos, sociais, económicos, políticos, naturais e ambientais, pelo que é por excelência o espaço ideal de aplicação de políticas de sustentabilidade27.

As múltiplas dimensões da sustentabilidade urbana, que devem ser consideradas numa atuação prática no terreno, como forma de minimizar os desequilíbrios de um espaço humanizado, deverão ter em conta não só os interesses dos cidadãos atuais, mas também dos das gerações vindouras. É necessário a adoção de uma abordagem holística e multidisciplinar, numa visão integrada e estratégica, na medida em que a cidade enquanto sistema resulta da interação de diferentes domínios, nomeadamente: o edificado, os transportes e acessibilidades, a estrutura verde e o espaço público urbano, os aspetos socioeconómicos e funcionais, e a própria morfologia urbana, de entre outros28. É também necessário considerar as exterioridades, comuns em contexto urbano, que se acentuam em áreas marginalizadas e ostracizadas.

A articulação entre a comunidade e o mundo exterior pode ser explorada com base na perspetiva de Anthony Leeds, que para o estudo de agrupamentos de pessoas rejeitou a ideia de “ilha”, quer seja uma aldeia, uma tribo, uma cidade, ou uma aglomeração de pessoas no espaço (como as minorias), defendendo que um qualquer grupo localizado de pessoas tem de ser pensado como um núcleo ou ponto modal dentro de um sistema de relações com outros núcleos ou pontos modais, o que vai constituir o sistema urbano29. Acresce que, ao inserir as minorias, fazemos cidade, como refere Coelho30.

O trabalho da população da Cova da Moura desenvolveu-se de forma a agregar todas essas necessidades, sobretudo na relação com o exterior, não só pela imagem que pretende transmitir, mas porque carece de harmonia e de proveitos económicos resultantes de serviços e comércio prestados internamente e ao exterior e, no âmbito da sustentabilidade urbana, baseia-se no cruzamento de três vertentes: (i)o equilíbrio do crescimento urbano (chegada e saída de emigrantes), (ii) os aspetos sociais, as atividades económicas, a vitalidade socioeconómica (manutenção de serviços e produtos coétnicos)31, e a qualificação ambiental do espaço urbano, não só pela melhoria do património edificado, mas também as acessibilidades (quase inexistentes dentro do bairro) e (iii) o sistema de transportes públicos ajustado ao tipo de atividades e necessidades.

Como evoluiu o conceito? O termo “desenvolvimento” começou por ser usado pelo poder político e económico como sinónimo de “crescimento económico”, aplicado ao crescimento das cidades por via do desenvolvimento industrial. Tratava-se de um “desenvolvimento” de génese capitalista e utilitarista32, uma vez que as cidades não visavam proporcionar prazer e felicidade aos seus habitantes, mas antes alojar no menor espaço o maior número de pessoas. No entanto, ainda no século XIX vários autores tentaram alterar essa conceção de desenvolvimento das cidades, como Howard (1898), através da obra Garden Cities of Tomorrow (1902)33, publicada inicialmente com o título Tomorrow: a Peaceful Path for True Reform (1898), onde contabilizou as vantagens (e as desvantagens) de viver no campo e na cidade, e propôs um novo modelo, a “Cidade Jardim” (um mix de ambos os ambientes).

Quase um século depois de Howard ter concebido a cidade jardim, um modelo de elevada sustentabilidade urbana, e depois de vários avanços e recuos na forma de conceber as cidades, é que adquire notoriedade o conceito de “Desenvolvimento Sustentável”, com a publicação do relatório “Our Common Future” (1987), altura em que também se reinventa a necessidade de controlar a desenfreada urbanização e de melhor adequar a relação da cidade-campo34. O “The Limits to Growth” apontava no mesmo sentido, fazendo-o de forma mais incisiva e apontando para a redução da população mundial e não para a redução da expansão da urbanização35, aliás, o que lhe motivou algumas das criticas, mormente de pessimismo36. A Conferência das Nações Unidas sobre os Povoamentos Humanos (UN-HABITAT), realizada em 1976, em Vancouver, deu o primeiro passo para alcançar a sustentabilidade urbana. Tinha como missão promover o desenvolvimento sustentável dos estabelecimentos humanos e a aquisição de abrigo adequado para todos. Posteriormente, no início de 1990, a UNEP e a UN-HABITAT criaram o Sustainable Cities Programme (SCP), um programa baseado em abordagens participativas (modelo colaborativo de base alargada) com vista à promoção de um espaço urbano planeado e ambientalmente sustentável (gestão urbana). Este programa teve uma primeira fase entre 1991 e 2001, e uma segunda entre 2002 e 2007, centrada na promoção de processos urbanos de governança ambiental.

Nas últimas duas décadas foram exponenciados os acontecimentos ou conferências em continuidade à Conferência de Vancouver (1976), um pouco por todo o mundo, o que revela que apesar da variedade das comunidades humanas existentes por todo o mundo, per se espelho das suas idiossincrasias socioculturais e de problemas mais ou menos exclusivos (princípio de Maclaren37), é inegável a existência de problemas totalmente transversais, designadamente: migrações populacionais, sob diversas formas; preconceito, quando não hostilidade, em relação a certas minorias, sejam elas étnicas, religiosas, sexuais ou de outra qualquer natureza; o crescimento demográfico mundial e as suas repercussões mais imediatas no seio de um mundo movido pelas virtudes e deméritos do capitalismo e das sociedades de consumo. Ora, relacionando tais problemas com um urbanismo nem sempre preocupado nem harmonioso, diagnostica-se o panorama atual; e percebe-se o(s) porquê(s) de se promoverem cada vez mais conferências, colóquios, workshops e iniciativas várias, com propósito essencialmente duplo: por um lado, informar todos os cidadãos do que está em causa, por sermos todos vizinhos na Aldeia Global; por outro, procurar fazer com que se reflitam, debatam e alcancem consensos quanto às alterações comportamentais a adotar, ora individualmente ora em sociedade, para que se caminhe ao encontro desse amanhã, melhor e mais bem garantido – em que viver na cidade será tão possível e digno quanto possível e digna será a cidade em si mesma.

 

Metodologia

O estudo do território exige um conhecimento global e local das situações, que permita uma análise sistémica englobante das complexidades e das dinâmicas em jogo. Foi fundamental o recurso a metodologias qualitativas e quantitativas, numa perspetiva associativa, avaliativa e crítica38.

Recorreu-se à observação direta, realizada no segundo semestre de 2013, através da qual se analisaram aspetos geográficos, históricos, antropológicos e sociológicos, permitindo uma análise com fundamento no conhecimento pluridisciplinar, e assim melhor se percecionar os aspetos físicos e humanos, as estruturas económicas, sociais e culturais, e as dinâmicas do território39.

Considerado como um espaço “marginalizado”, para o qual não existem estatísticas oficiais fidedignas relativamente a todos os assuntos abordados, os dados mais fiáveis são os que provêm das organizações locais. Recorreu-se à informação transmitida pelos residentes e pelo guia do Sabura, no que se refere aos aspetos culturais do quotidiano, e pelos elementos da Associação Moinho da Juventude e do Gabinete Local da Câmara Municipal da Amadora. Foi assim possível ter dados quantitativos das atividades económicas e dinâmicas populacionais e do Projeto Sabura, que em muito completaram esta memória, bem como dados qualitativos sobre a economia etnocultural em todas as suas manifestações: idealizáveis, possíveis e visíveis.

É um território de forte economia subterrânea, e tem uma elevada dinâmica de circulação de pessoas, bens e serviços. O que é hoje, amanhã pode já não o ser. Assim, de forma complementar optou-se por fazer nova recolha da informação das atividades económicas e locais de comércio e serviços, por observação de participante, na semana entre 9 e 16 de outubro de 2013.

 

Caracterização da área de estudo

O Bairro da Cova da Moura localiza-se na parte oriental do município da Amadora (38º 44’ 40’’ de latitude N e 9º 12’ 50’’ de longitude W), nos arredores de Lisboa (Portugal), e abrange uma área aproximada de 16,5 ha40. Foi construído de forma clandestina em terrenos maioritariamente privados, e para efeitos administrativos integra as freguesias da Damaia e Buraca41. Está próximo de alguns eixos rodoviários importantes, como o IC 19 e o Nó da Buraca, e é servido pela linha ferroviária de Sintra42.

 

Figura 1: Localização geográfica do Bairro da Cova da Moura, na freguesia da Damaia e da Buraca.

Adaptado de INE, 2013.

 

A Cova da Moura teria cerca de 1000 residentes em 1981, entre 3500 e 4000 em 1991, 5.081 habitantes em 200043, cerca de 5500 em 200644, e próximo de 5000 em 200845. O censo de 2011 aponta para uma população residente de 3.571 indivíduos (1.838 mulheres e 1.733 homens)46, e o estudo de caracterização e diagnóstico realizado no âmbito do Plano de Pormenor da Cova da Moura para 3.638 indivíduos47. A população residente considera que o bairro terá cerca de 6.000 indivíduos residentes, e a Associação Cultural Moinho da Juventude (ACMJ) aponta para 7.000 indivíduos48.

O Bairro da Cova da Moura foi um dos últimos bairros clandestinos a ser construído no concelho da Amadora, já com melhores condições habitacionais (alvenaria), por comparação com outros, como o Bairro Estrela de África, onde as barracas foram num primeiro momento construídas com recurso a madeira e chapas e, mais recentemente, na viragem do século, reconvertidas para alvenarias, geralmente recebendo acrescentos, em desrespeito pelas regras de planeamento e urbanismo português49.

O Bairro da Cova da Moura constitui-se de edifícios maioritariamente para a função residencial50 também um grande número de unidades de comércio e serviços, que resultaram da utilização de sistemas e processos de construção muito diversos, maioritariamente de autoconstrução51, sem projeto, planeamento ou controlo de obras, quase sempre com recurso ao conhecimento que os proprietários tinham da construção. A forma e ornamentação dos vários elementos construtivos resultou dos materiais que conseguiam “recoletar”, condicionados que estavam pela carência de recursos financeiros. Em consequência, existe um manto de edifícios que coexistem em estágios de construção diferentes52, caracterizados por uma grande diversidade tipológica, tanto em termos funcionais como formais, e de materiais. No mesmo edifício pode existir: grande diversidade de materiais aplicados (ex. ferro, betão, madeira, etc.), de elementos e formas (ex. escadarias internas e externas), de cores (as pinturas internas e externas são de cores muito diversificadas, mas predominam tonalidades fortes e alegres), e caixilharia sem unidade formal53. Não obstante, os edifícios espelham um quadro de referências simbólico-culturais, portanto, a identidade dos proprietários (pessoal e cultural), o seu modo de viver, a sua sensibilidade e os seus gostos. O mesmo acontece com o graffiti, dispositivo de reflexão identitária, mecanismo de intervenção, de contestação das representações predominantes. Como referem Campos e Vaz, os murais “parecem estar ligados a políticas de identidade que visam a contrariar o estigma e, simultaneamente, celebrar uma identidade étnica e de bairro”54.

Campos e Vaz55 individualizam dois grupos de murais, com base na iconografia existente no bairro, um de figuras negras no campo da luta política contra a descriminação e diminuição dos direitos cívicos das populações negras, como Martin Luther King e Amílcar Cabral, e outro ilustrativo de dificuldades sociais, violência e descriminação de que são alvo os habitantes. Estes murais estão maioritariamente localizados no interior do bairro, o que reduz o seu acesso, e para os visitantes o seu interesse advém exclusivamente da técnica e da beleza da pintura, e não da sua mensagem.

Uma estratégia de atração para o exterior, e de integração, seria a criação de murais representativos de uma linguagem comum, um passado e um destino comuns, por extensão da ideia de nacionalismo de Löfgren56. Acreditamos que a pintura recente do mural de homenagem a Eusébio da Silva Ferreira, uma figura de reconhecimento coletivo, um símbolo de identidade nacional, integrante da galeria de mitos e heróis nacionais, em área acessível entre o espaço do bairro e o espaço contíguo, é um sinal profícuo de abertura ao exterior, com vista ao desenvolvimento social e sustentabilidade.

Dos problemas construtivos mais graves detetados, destaca-se a proximidade entre edifícios, o que denuncia problemas de privacidade, insolação e segurança (existem edifícios que compartilham a mesma escada de acesso), problemas de salubridade, reduzidas áreas úteis das instalações sanitárias, e com pé-direito inferior ao regulamentar, acessibilidades realizadas por estreitas passagens, algumas vezes inferiores a um metro, com degraus em largura e altura de dimensões não regulamentares, ou até desnivelados ou sem proteção adequada, o que coloca em causa a segurança das pessoas em caso de necessidades de socorro, como um incêndio, e impede a circulação de pessoas de maior idade57.

A demolição não é a melhor solução para as anomalias construtivas ou espaciais detetadas, muito menos a normalização ou padronização, porque a ausência de uma unidade unificadora não é um elemento depreciativo, pelo contrário, é distintivo. A destruição de elementos construtivos, se inevitável, deve ocorrer dentro do estritamente necessário à requalificação física do espaço, renovando o seu caráter próprio e único, como advoga Manuel Graça Dias, num artigo na Revista da Ordem dos Arquitetos58:

“ […] são casas populares lisboetas de hoje, escolhidas ao acaso entre as muitas que nos emocionam num conjunto para onde se prepara a “normalização”.

 

Figura 2: Património edificado degradado no bairro (15/06/2010).

Quadro 1: Evolução da estrutura etária dos residentes no Bairro da Cova da Moura, entre 2001 e 2011.

 

Casas, na sua maioria de imigrantes, entre o pragmatismo e a alegria; entre as formas modelares “modernas”, propostas pela racionalização do betão (topos de laje, palas, pilares, vigas arrastadas de dentro, vãos rectangulares) e uma intuição construtiva e estrutural quase “natural” (cachorros, capitéis, escoras, tirantes, balanços sobre a rua).

Pintadas com combinações disparatadas e expeditas ou completadas com mais demoradas texturas, entre desperdícios de mármore ou azulejos industriais. Recessos para a sombra, máscaras sobre alçados recuados, terraços imprevisíveis ou só incompletos, ainda. Vãos de tamanhos diferenciados, entre aquelas das janelas, pequenas, salvas do lixo, e as maiores, mais desejadas, ao lado”.

Do ponto de vista populacional, em 2011 a estrutura etária tinha a seguinte composição: menos de 15 anos (15,27%); entre os 15 e os 24 anos (15,51%) (os populares dizem ser esta a classe mais desordeira); entre os 25 e os 64 anos (55,65%); e igual ou superior a 65 anos (13,57%). Na última década não só reduziu o grupo dos jovens como aumentou a representatividade da população mais idosa, o que aconteceu na mesma linha da evolução demográfica nacional59.

 

Quadro 1: Evolução da estrutura etária dos residentes no Bairro da Cova da Moura, entre 2001 e 2011.

Grupos Funcionais

2001

2011

Variação

0-14 anos

23,1

15,27

-7,83

15-24 anos

23,0

15,51

-7,49

25-64 anos

53,9

55,65

1,75

65 ou mais anos

7,48

13,57

6,09

TOTAL

100.0

100.0

-

Fonte: CMA, 2012, p.23.

 

O desemprego entre jovens do sexo masculino é elevado, o que potencia a degradação social e fomenta a marginalidade. Os jovens, quando lhes é permitido trabalhar, fazem-no muito cedo, entre os 17/18 anos. Cerca de 50% da população masculina, em idade ativa, trabalha na construção civil. A população feminina trabalha essencialmente nas limpezas, restaurantes, peixarias, frutarias e serviços domésticos.

É um espaço de fortes “redes de sociabilidades, de vizinhança e de parentesco articulada com o emprego e o recrutamento de pessoal entre parentes, conterrâneos e vizinhos do bairro, o que é simultaneamente garantia e compromisso de entreajuda e reforço de laços, numa multiplicidade de facetas e valências sociais”60. Apesar de não poucas vezes os mais velhos considerarem os mais novos insubordinados, no oposto, os jovens consideram que colocar os seus familiares mais idosos em lares é sinónimo de abandono e refutam na totalidade esta possibilidade, ficando com os familiares idosos em suas casas, o que reforça as relações geracionais.

Não existe rivalidade entre classes sociais, grupos religiosos ou frações étnicas dentro do bairro. Existe mesmo um princípio precípuo de solidariedade intergeracional, de colaboração social, e de liberdade religiosa, de crença e consciência, que se materializa em diversos espaços de culto, alguns para as massas, outros reservados em casas particulares.

Os espaços de comércio e serviços são muitos e variados, e encontram-se dispersos pelas várias zonas do bairro. Considerando os 3.638 indivíduos residentes no bairro61, e os 123 estabelecimentos de comércio e serviços identificados em 2013 (quadro 2), temos qualquer coisa como ≅30 habitantes p/ estabelecimento.

Existem várias combinações de comércio e serviços que dependem do grau de proximidade e de inter-relação entre os serviços prestados e os produtos vendidos. O quadro 2, onde também se identificam os parceiros comerciais do Projeto Sabura, revela essa forte miscigenação nos espaços de comércio e serviços.

 

Quadro 2: Quadro evolutivo do número de estabelecimentos de comércio e serviços entre 2002 e 2013.

Bairro Alto da Cova da Moura
Estabelecimentos de Comércio e Serviços62

Atividade

200263

200664

200865

201366

Parceiros do Sabura

201367

Café, snack-bar, bar dancing, cervejaria, e afins

40

42

39

30

Cabeleireiro e barbearia

20

33

21

19

-Cabeleireiro Lopes
-Cabeleireiro Da Neuza
-Cabeleireiro Martuxa
-Cabeleireiro Stalone
-Cabeleireiro Pérola negra
-Cabeleireiro Freestyle
-Cabeleireiro Afro style

Cabeleireiro e Café

-

-

1

-

Loja de produtos para cabelos

1

-

-

-

Cabeleireiro e bijuteria

-

-

1

1

Cabeleiro, Barbearia e Restaurante

-

-

3

-

Cabeleiro, escritório e restaurante

-

-

1

-

Restaurantes (com ou sem café, bar ou cervejaria)

7

18

9

18

-Restaurante Pedro Ramos
-Restaurante A Princesa do Bairro

-Restaurante Chili
-Restaurante Coqueiro
-Restaurante Passa Sabi
-Restaurante Unidos da Fronteira
-Restaurante Nós Casa
-Restaurante Vulcão
-Restaurante João Roque
-Restaurante Di Nós
-Restaurante Cantinho do Sossego
-Restaurante Cantinho do Telhado
-Restaurante Kok Bafa
-Restaurante Santo Antão

Churrascaria (com ou sem café, bar ou cervejaria)

2

-

1

3

Oficina de reparações (carros e eletrodomésticos), estofador, pinturas (com estufa), sucata e afins (ferro velho)

12

9

13

8

Oficina e cabeleireiro

-

-

1

-

Serralharias (ferro, inox-aluminio, PVC), marcenarias, canalizadores, armazens de materiais de construção (incluindo os escritórios) e comércio de tintas, e afins.

12

8

4

4

Bijuteria, retrosaria e loja 300

3

3

2

2

Loja vestuário, costureira, calçado e afins

2

3

6

4

Talho e peixaria

3

3

2

3

Mercearia, mini-mercado, charcutaria, e frutaria (com ou sem café, snack-bar ou cervejaria)

15

13

12

15

-Mercearia Bom Paladar Familiar
-Mercearia Mumini
-Doçarias da Noti

Mercearia e dentista

-

-

1

-

Padaria, pastelarias e mercearia

1

2

1

1

Pastelaria, Café, Snack-Bar

-

-

-

1

Telemóveis e comunicações

-

2

-

2

Sorveteria, internet e telecomunicações

-

-

1

1

Tipografia, serigrafia e fotografia

3

3

2

-

Mobiliário e decoração

1

1

1

Loja discos e discoteca

2

1

1

1

Discoteca e barbearia

1

-

-

-

Agência viagens, contabilidade e serviços

4

1

1

1

Mediação de Seguros / Agência de Publicidade, e afins

2

1

1

1

Empresa transportes e transitários

1

1

-

-

Lavagem e aspiração de carros

-

-

-

2

Jardim de infância, cheches e amas

3

-

-

2

Comércio de gás

-

-

-

1

Consultório Médico – Clinica Geral

1

-

-

1

Fábrica de Redes e Vedações

1

-

-

-

Engomadeira

1

-

-

-

Escritório

-

-

5

-

N/Identificados (confeção de iguarias caseiras típicas de Cabo Verde)

-

3

-

1

Total

138

147

129

123

 

 

Os espaços comerciais mais visíveis e importantes para a sustentabilidade social e desenvolvimento do bairro são: restaurantes, cabeleireiros, mercearias, bares e cafés. Por registo visual constatámos que os comércios mais prósperos (pela dimensão do espaço e asseio, e volume de visitas diárias) são os associados ao Projeto Sabura (restauração, mercearias e cabeleireiros), acreditamos nós, por estarem integrados no percurso Sabura, o que induz ao consumo, e por estarem direcionadas ao comércio de coétnicos.

O comércio ao ar livre (não consta do quadro 2) faz-se geralmente de bens essenciais, de frutas, carne, peixe e espigas de milho verde assado, e de peças diversas de vestuário e fio de cobre. É o mais itinerante. Os comerciantes utilizam a sua habitação para armazenagem e a via pública para venda.

 

Atuação da Associação Cultural Moinho da Juventude (ACMJ)

O Estado e a sociedade em geral, por falta de interesse ou desconhecimento, falharam na resolução dos problemas dos imigrantes. A estes restou constituir uma associação representativa e assim “forçar” o diálogo com as instituições públicas. Em 1984, fundaram a ACMJ, constituída oficialmente em 1987, que tem representado a comunidade com enorme dignidade, tem feito um trabalho notável, e granjeou o reconhecimento público a nível local e regional. Em 1989 foi reconhecida como IPSS, sendo ONGD desde 2010. É muito importante no projeto de reestruturação social do bairro, contando com o apoio e colaboração dos residentes, também fundadores da própria Associação, numa atuação conjunta à qual assenta o epíteto: todos juntos, todos unidos (Djunta Mo – em crioulo). Constitui, assim, um caso digno de registo, que adotou as melhores metodologias para gerar sinergias que têm vindo a potenciar a sustentabilidade urbana em territórios de pobreza e exclusão social.

São doze as premissas de atuação dos residentes que atuam na ACMJ: (i) interculturalidade, respeitando a cultura própria e a cultura dos outros; (ii) incentivo ao diálogo e à comunicação; (iii) estímulo à alegria e à boa disposição; (iv) estimulo das componentes masculinas e femininas que existem dentro de cada pessoa (gender); (v) respeito pelas convicções políticas e religiosas individuais; (vi) promoção do trabalho em grupo e da cooperação; (vii) valorização das capacidades próprias e dos outros, e participação na reflexão e na tomada de decisão baseada na reflexão (empowerment); (viii) respeito pelo ambiente; (ix) promoção da criatividade; (x) persistência e não desistência dîante dos primeiros obstáculos; (xi) execução do trabalho com qualidade, eficiência e eficácia; e (xii) solidariedade, particularmente com as pessoas que tiveram menos oportunidades.

 

Figura 3: Comércio de fruta na rua Principal (11/10/2013).

 

A ACMJ tem como prioridade lutar contra a insustentabilidade social, económica e ambiental, e contra o estigma externo e a degradação física do bairro. Foi determinante ao mediar as divergências entre os interesses dos residentes e os interesses dos proprietários do terreno, onde está implantada a comunidade, quando estes últimos, na última década, tentaram reaver o terreno e demolir o bairro, propondo o realojamento dos habitantes em apartamentos a construir pelo Estado (habitação social). Uma atitude dos proprietários que está relacionada com o valor comercial dos terrenos, fruto da sua posição geográfica, a escassos quilómetros da Capital, e que teve uma resposta firme da comunidade, surpreendente por ter produzido resultados contrários ao postulado por David Harvey, que considerava que num mundo globalizado o capitalismo localizado numa hierarquia de poder urbano, mas não situado num só lugar, é a perspetiva mais poderosa68.

 

Figura 4: Comércio de peixe na rua Principal (10/10/2013).

 

A Associação procurou desde sempre dar voz aos habitantes, de forma a valorizar o capital humano, melhorando as possibilidades de harmonia social e desenvolvimento económico, e abriu horizontes ao apontar caminhos duradouros e sustentáveis, realçando as oportunidades, mas nunca negligenciando as ameaças. Foi um trabalho árduo, em parte porque trabalhar com pessoas não é fácil, principalmente quando estas se sentem hostilizadas pelo mundo em redor. Nesse âmbito, realça-se a batalha ideológica travada no sentido de ganhar a confiança da população, com vista à implementação do Projeto Sabura, grande referência do momento, o qual não poderia funcionar sem a colaboração de todos os residentes69.

 

Figura 5: Comércio de espiga de milho verde assado na rua Principal (10/10/2013).

 

Com base na dinâmica do bairro, observada no terreno, não será abusivo dizer que o trabalho desenvolvido pela ACMJ, com base no Projeto Sabura, foi fundamental para a alteração do paradigma depreciativo dominante, contribuindo para transformar um espaço estigmatizado pela marginalidade e pela criminalidade num espaço valorizado pelos traços culturais. Foi possível reforçar a identidade dos seus moradores e gerar proveitos financeiros essenciais para a sobrevivência dos agentes económicos que estão implementados no bairro, nomeadamente restaurantes, cervejarias, cabeleireiros e minimercados.

 

Figura 6: Descascar fio de cobre na rua 8 de Dezembro (12/10/2013).

 

O Projeto Sabura apesar de ter tido bastante sucesso e até amplitude mediática, não resume toda a obra da ACMJ. Esta desenvolveu um trabalho social distinto, procurando a sustentabilidade social e desenvolvimento do bairro, e merece que seja referenciada, ainda que de forma sucinta, mencionando os principais projetos que permitiram alcançar a atual solidez estrutural. Não podemos esquecer que a sustentabilidade urbana depende de um bom ambiente social, económico e ambiental.

Entre 1990/93 realizou dois cursos, um de corte e costura e outro na área do serviço doméstico, resultado da colaboração com o Sindicato de Serviço Doméstico, tendo por objetivo ajudar as mulheres residentes no bairro a conseguirem emprego.

Em 1994/95 dinamizou o Projeto NOW – New Opportunities for Women, que visava a inserção das mulheres na vida ativa, cam duas vertentes: um curso de formação de formadores com a duração de 60 horas, e um outro de formação profissional para Monitores dos Centros de Infância Multiculturais. Outro projeto simultâneo foi o Horizon, que constou de um curso de Formação Profissional de Animadores Sociais, destinado a jovens com poucas habilitações, mas com capacidade de liderança. Daí resultou a criação do “Espaço Jovem”. Outra ação foi a pré-profissionalização de 14 jovens com problemas de inserção social.

Entre 1995 e 1998, conseguiu a equiparação dos cursos à escolaridade mínima obrigatória pelo Ministério da Educação. Criou e desenvolveu o “Núcleo de Esperança” para jovens adolescentes e o “Núcleo de Intervenção na Prevenção da Toxicodependência”.

Entre 1997 e 1999, no âmbito do programa Leonardo e em parceria com a Associação para o Estudo e a Promoção do Desenvolvimento Comunitário de Barcelona, entre outras organizações europeias, contribuiu para a definição a nível europeu do Perfil do Mediador Intercultural e do curriculum de formação dos mediadores. No mesmo período, no âmbito do subprograma INTEGRAR, MEDIDA 2- Integração Económica e Social dos Desempregados de Longa Duração, promoveu o curso de formação “Economia de Bairro”. Com o apoio do Centro de Emprego da Amadora realizou dois cursos certificados, de formação de formadores, destinados aos colaboradores e responsáveis dos diferentes núcleos da ACMJ, que trabalhavam com indivíduos de todas as idades.

Em 2004 iniciou o Projeto Cegonha no quadro do URBANII, e no quadro do POSI colocou a funcionar a sala NAVEGA, dotada de 12 computadores disponíveis para crianças, jovens e adultos do bairro.

Do ponto de vista educacional desenvolve as seguintes atividades: Creche “A Árvore” (acolhe 60 crianças dos 4 meses aos 3 anos), Creche Familiar “O Moinho” (acolhe 80 crianças dos 3 meses aos 3 anos), Jardim-de-infância (acolhe 84 crianças dos 3 aos 5 anos), Centro de Atividades de Tempos Livres (CATL) (colónia de férias e apoio escolar a 180 crianças e jovens), e Projeto PULO (formação parental) em que quatro “Mães de Bairro” acompanham ao domicílio 84 famílias com crianças entre 2 e 4 anos, tendo em conta o horário de trabalho dos pais e as necessidades do bairro. Existe ainda o projeto Caleidoscópio que assume a operacionalização do PULO, entre outros, como “Cozinha Comunitária”. No Moinho funciona uma Cantina Social que fornece diariamente o almoço a 110 moradores.

Para integrar e familiarizar a comunidade com as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), a ACMJ criou há mais de 14 anos um polo informático chamado Bê-á-bá da Net, onde administra formação a jovens e adultos, nas áreas de Internet, Windows, Word, correio eletrónico e motores de busca.

Criou vários núcleos de acordo com as necessidades locais: o Núcleo de Apoio aos Moradores com a função de melhorar as condições de habitação, limpeza e higiene do bairro, o Núcleo Socioprofissional, visando a formação ajustada à empregabilidade dos moradores, e o Núcleo Sociocultural, alicerce económico do bairro.

Tem apostado na área da formação profissional, realizando cursos de Educação e Formação de Adultos (EFA), em parceria com a Direção Geral de Formação Vocacional (D.G.F.V.), onde se destaca o curso de “Acompanhante de Crianças”, entre muitas outras atividades e iniciativas multissetoriais.

Podem parecer aleatórias ou fortuitas, mas todas as iniciativas referidas fazem parte de um propósito e de um programa, com um fio condutor, que pretende reabilitar o espaço, tornando-o sustentável, e preservar e divulgar a cultura primária dos moradores. Foram preparadas visando elucidar os jovens para as oportunidades da vida honesta, realizável e prestigiosa, conforme nos dizem as pinturas presentes nas paredes da ACMJ, ilustradas na figura 2: “…um outro mundo é possível se a gente quiser…”.

 

A sustentabilidade urbana resultado de práticas empreendedoras pela ACMJ

O turismo étnico é uma das atividades de promoção do espaço com maior destaque. É extremamente dinamizador, está bem estruturado, e satisfaz os residentes e os visitantes, que acabam por deixar o bairro com uma ideia mais positiva do que aquela com que tinham chegado, em prol do património humano e cultural, e sobretudo da riqueza étnica. Exemplo disso é o Projeto Sabura, também designado de Percurso Sabura, iniciado em 200370, desenvolvido pela ACMJ, com algum apoio financeiro do Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural, I.P. (ACIDI), que alterou o paradigma do turismo étnico em Portugal, até essa altura muito incipiente71 e representou os alicerces de toda a dinâmica económica, cultural e social que o bairro projeta para o exterior72.

 

Figura 7: Fachada (traseira) do edifício da ACMJ (15/06/2013).

 

Este projeto promove a sustentabilidade numa dupla vertente, primeiro, apresenta o lado positivo do bairro e segundo, “vende” a cultura sobre a forma de serviços. Organiza, por exemplo, visitas guiadas ao bairro, reforçando o facto que a realidade é bem diferente da estigmatizada pela comunicação social, que não raras vezes confunde acontecimentos pontuais e fraturantes com vivências rotineiras quotidianas. De acordo com os populares, a expressão crioula Sabura significa “apreciar aquilo que é bom, saborear”.

As visitas consistem, numa primeira fase, num passeio pelas instalações da ACMJ, onde os visitantes recebem informação acerca do trabalho que está a ser desenvolvido, e numa segunda fase, num passeio pelo bairro na presença de um guia. Este é um dos projetos mais importantes, não propriamente pelos proveitos financeiros diretos73, para a ACMJ, mas pela abertura da comunidade ao exterior, pela presença de pessoas externas no interior, muitas vezes de estratos sociais médios e elevados, sobretudo do sexo feminino, e pela dinamização de serviços e comércio durante as visitas.

 

Figura 8. Projeto Sabura - Evolução do número de visitas (2003-2013)

 

Estas visitas promovem a gastronomia, pilar da sustentabilidade da comunidade, pois só assim se justifica que dos dezoito restaurantes presentes no bairro, catorze são associados do projeto (quadro 2). Cada um representa uma ilha cabo-verdiana, mas podem existir vários a representar a mesma ilha, de que é exemplo o caso da ilha de Santo Antão, representada por dois restaurantes e por uma cervejaria. Os restaurantes mais simbólicos são: o Vulcão, representante da ilha do Fogo; o Coqueiro, Sr. Augusto e Cantinho do Sossego, representantes da ilha de Santo Antão; e a Princesa, representante da ilha de Santiago.

Todos os restaurantes associados ao Sabura estão obrigados a investir na melhoria da higiene, segurança e qualidade; disso depende a manutenção do título de associados do projeto. É da responsabilidade da ACMJ a monitorização destes espaços, para que nunca esteja em causa a qualidade no atendimento aos clientes. Dos vários pratos tradicionais que se confecionam no bairro destacam-se a Cachupa, Mandioca, a Caldeirada de Cabrito, o Feijão Congo, o Feijão Pedra, o Caldo de Peixe, o Guisado de Borrego e a Banana Verde. Para acompanhar o prato, ou depois da refeição, a sugestão é um copo de grogue ou de ponche, duas bebidas típicas nas ilhas, algumas vezes ao som de música ao vivo.

Como é promovida a gastronomia? De que forma colabora na sustentabilidade social e desenvolvimento do bairro? Existem visitas para apreciar a dinâmica da manhã e da tarde, mas em todos os casos é possível tirar fotografias e conviver com os habitantes, apreciando a sonoridade das palavras e descobrindo a sua cultura. Os visitantes são convidados a almoçar ou jantar, consoante o caso, por um preço convidativo, o que geralmente aceitam fazer. Durante o período da refeição surgem vários convites, ora por parte do guia, ora por parte do proprietário do restaurante, no sentido de difundirem o melhor possível a gastronomia e assim trazer mais valor ao bairro. É disponibilizado aos visitantes receitas de comidas tradicionais e ainda são indicadas mercearias dentro do bairro que fornecem os produtos necessários à sua confeção, de forma a dinamizar o comércio. É também estimulada a oferta de serviços de cabeleireiro. A título de exemplo, se o almoço for a famosa feijoada de congo, a sugestão pode ser a de comprar o feijão e/ou outros ingredientes na mercearia Bom Paladar Familiar, para experimentar em casa outros sabores diferentes dos que tinham constituído a refeição. Quando a visita ocorre no período da tarde, a sugestão pode passar por um jantar com música ao vivo, precipitando uns pezinhos de dança tradicional, o que também dinamiza os bares. Como à tarde “os assadores saltam para as ruas”, é quase obrigatório provar os produtos comercializados nas ruas, como os torresmos, o doce de coco, as espigas de milho verde assadas e os pastéis de atum, milho e trigo. A visita também pode ser mais pedagógica, aprendendo a tocar batuque74 ou a dançar hip hop. Existem muitas outras soluções, mas, mais importante, existe a possibilidade do programa ser personalizado, em função do gosto e interesses de quem visita, o que indica que o nível de violência no bairro é reduzido, caso contrário estas dinâmicas personalizadas tornar-se-iam arriscadas e não realizáveis. É uma realidade muito diferente do que acontece com programas semelhantes nas favelas do Brasil ou da África do Sul, onde os guias restinguem-se a áreas não problemáticas ou andam armados. O facto de as visitas serem frequentadas maioritariamente por mulheres (gráfico 1) é um sinal de pacificidade e também um importante recurso para o desenvolvimento social e sustentabilidade do bairro, por extensão da enunciação ecofeminista75.

O comércio etnocultural aparece associado ao turismo étnico. Mas porque é importante para a sustentabilidade social e desenvolvimento do bairro? Francisco Lima da Costa reforça a importância deste comércio, por um lado, na promoção cultural e na sustentabilidade financeira da comunidade, e por outro, para quem procura os serviços, “pessoas vindas de todos os pontos do país e do estrangeiro”, que usufruem de um serviço que não existe noutro lugar, económico e com qualidade, e que “criou um mercado, essencialmente de coétnicos”76.

Pela importância económica para o bairro, destacam-se ainda os cabeleireiros e as pastelarias (muitas vezes integradas em restaurantes ou padarias, conforme quadro 2), sectores dinamizados pelo Sabura.

O que torna os cabeleireiros atrativos e promotores da sustentabilidade é a modernidade, a inovação e o empreendedorismo. Uma das grandes atrações é o facto de ensinarem a fazer tranças, tanto em brancos como em negros, a preços mais baixos dos praticados fora do bairro (entre 7,5 e 10 euros por serviço de cabeleireiro). O salão Pérola Negra, o mais frequentado pelos residentes no bairro, também recebe clientes de fora, à procura de novas tendências em matéria de tranças e penteados africanos.

O que torna as pastelarias atrativas? Uma das mais recomendadas, a Casa Da Nóti, que comercializa doces, salgados e cuscuz, típicos da Ilha de Santiago, Cabo Verde (figura 8). A confeção de doces típicos criou uma ligação cultural/gastronómica que permite aos imigrantes cabo-verdianos, consumir em Portugal produtos iguais aos que consumiriam em Cabo-Verde.

No bairro vendem-se produtos para a comunidade local mas também para o exterior, principalmente para africanos que residem na linha de Sintra e que aqui se deslocam para fazer as suas “compras étnicas”. De acordo com os populares, muitas vezes os visitantes aproveitam o facto de irem fazer compras para tratarem do seu cabelo (fazer umas tranças), ou até para visitarem familiares, se for caso disso.

O sistema comercial, que funciona com alguma fluidez, remete para centros comerciais modernos, onde se encontram disponíveis as mais variadas valências. Na realidade é um “ecossistema humano”, com muitas semelhanças a um ecossistema natural, onde todos os organismos têm uma função, são necessários e interventivos no processo.

Existem ainda outros serviços empreendedores, ainda que diminutos, que emergiram fruto da dinâmica produzida pelas atividades anteriores. Importa referir uma pequena empresa que presta serviços de passaportes, vistos, viagens aéreas, documentação diversa e contabilidade. Trata-se de um empresário que quer tirar proveito deste mercado florescente77, não prestando um serviço de raiz cultural, mas antes um serviço de aproveitamento cultural, específico, vocacionado para este espaço, pois trata de documentação e viagens, sobretudo para Cabo Verde.

A criação de grupos culturais, como o Kolá S. Jon e o Grupo de Batuque Finka Pé, e de projetos como o Finka Pé, promove a dança e a música, e simultaneamente a comunidade78, sobretudo na vertente social, indo ao encontro das necessidades educacionais dos jovens. Estes grupos também dinamizam a economia do bairro, ao promoverem as festas culturais, um fator de atração para os muitos africanos, realizadas quase sempre ao som do batuque e do funaná.

Para promover o potencial humano a ACMJ criou o Kova M Studio, onde foi gravado o álbum KovaM Realidade Nua e Crua, que exterioriza a realidade social da Cova da Moura, muitas vezes através de música de intervenção.

 

Figura 9: Doces Salgados e Cuscuz (15/06/2013).

 

Destaca-se a festa tradicional de Kola San Jon, que se realiza nas ilhas de Santo Antão e São Vicente, e que foi reinventada no bairro da Cova da Moura. Festejos agora considerados como Património Cultural Imaterial da Cova da Moura79. É uma festa que recebe muitas visitas e tem como ponto alto um animado cortejo pelas ruas do bairro, onde algumas pessoas se movimentam com barcos de pequena dimensão e de vários formatos, quase sempre aludindo a momentos da sua história. Estes podem representar caravelas portuguesas ou corsários estrangeiros, em prol dos constrangimentos e perdas que a implacável ação corsária infringiu aos cabo-verdianos, ainda na dependência de Portugal, nomeadamente pelas mãos de Drake, que destruiu a mais antiga capital do arquipélago, atualmente conhecida como Cidade Velha. Outros participantes apimentam o ambiente com uma espécie de dança erótica, sempre ao ritmo frenético dos tambores. O ritual realça a beleza do seu local de origem, enfatiza a própria notoriedade, e reforça a diversidade étnica no espaço urbano. Esta festa, como identidade étnica e de bairro, está bem patente no mural a seguir ilustrado.

 

Figura 10: Cabeleireiro Neusa (15/06/2013).

 

Kola San Jon é mais do que uma tradição importada de Cabo Verde e implantada na Cova da Moura, cruzando influências africanas e europeias80. É uma festa com carateres próprios, concebida de acordo com os reportórios culturais dos cabo-verdianos em migração, e naturalmente com as condições de chegada, e que conta com a presença de indivíduos muito distintos na forma como exprimem os seus reportórios culturais e religiosos. Para além de africanos contabilizam-se brasileiros, islâmicos, hindus e trabalhadores de leste, que mostraram grande agencialidade na migração, redefinindo os seus reportórios, o que promove alterações à estrutura da sua religião de base.

 

Figura 11: Pintura alusiva à festa “Kolá S. Jon”, realizada em 2013 pela ACMJ num muro localizado no início da rua do Moinho (17/10/2013).

 

O desporto e os jogos tradicionais são igualmente fundamentais para a promoção e sustentabilidade do espaço. Contribuíram também para o patrocínio a atletas vencedores, caso de Nelson Évora, atleta português, de origem cabo-verdiana, de nível olímpico, e amigo da Cova da Moura (figura 12). Um dos jogos mais recorrentes no bairro, o Oril, jogo tradicional de tabuleiro de disputa em competição, permite a interligação e difusão cultural através de torneios abertos à comunidade externa, aproximando a sociedade civil à comunidade da Cova da Moura (figura 13).

 

Figura 12: Títulos desportivos conquistados por atletas com ligação à ACMJ (14/06/2010).

 

Figura 13: Residentes a jogar o jogo Oril (14/06/2010).

 

A sustentabilidade urbana enquanto elemento de responsabilidade individual

Os projetos promotores da sustentabilidade social e desenvolvimento do bairro, ainda que maioritariamente promovidos pela ACMJ, são possíveis pelo afinco e dedicação de um vasto conjunto de habitantes, ou seja, são o resultado do esforço individual (agency) e coletivo dos residentes, na tentativa de promover o espaço.

Deve-se aos residentes a responsabilidade na luta contra o avanço do processo de demolição parcial do bairro, protegendo um modo de vida que privilegia a aplicação dos princípios básicos da natureza, integrando plantas, animais, edificado e pessoas, num ambiente produtivo e com estética e harmonia, de amor e felicidade81, que caminha no sentido dos princípios da permacultura de Mollison: “The only ethical decision is to take responsibility for our own existence and that of our children”82.

Conseguir a requalificação do bairro, em detrimento da sua demolição, foi dar um passo de gigante na persecução da sustentabilidade urbana. Foi uma grande conquista dos residentes, sofrida, e uma grande vitória da cultura nacional africana, em especial da cabo-verdiana, que vai “promover a autoestima identitária dos habitantes (…) e dar relevo a todo o património cultural que com estes viajou desde os seus países de origem”83.

O espaço sofre influências naturais e humanas, mas neste caso foi a capacidade criadora do homem que mais alterações provocou, desde a chegada dos primeiros residentes à Cova da Moura, altura em que o espaço foi adaptado e estruturado conforme as necessidades, passando a configurar uma nova realidade.

De acordo com os residentes, no início “houve o Djunta Mo” (juntar das mãos), filosofia de vida dos cabo-verdianos, que se ajudavam uns aos outros na construção da casa, mas também na procura de trabalho, na organização das festas de batizados e casamentos, e na transmissão da sua cultura (batuque e Kola San Jon), festividades proibidas nas colónias, antes do 25 de Abril de 1974, pelos governantes portugueses.

As alterações ao espaço foram providas de sentimento, necessidade, e de sacrifício pessoal e individual, porque foi com as suas próprias mãos que modificaram o espaço, tal como foi inscrito nas paredes dos muros do bairro e em alguns desdobráveis sobre o projeto Sabura:

[…] Foram tantas vezes, que muitas gentes, de muitos mundos, com alguns tijolos construíram mão-a-mão, pedra-na-pedra, vontade de muitos, vontade de todos…um lugar [espaço] onde poderá encontrar na música e nos sabores, o pilão e a mandioca, a cachupa e o crioulo, o grogue e o jogo do oril, o batuque e o funaná…o artesanato e os brinquedos de lata, as mil danças e as mil tranças. (Anónimo – negrito nosso).

Naturalmente, esta forma de “planear” mantém uma relação mais próxima entre o Homem e o espaço. Por cada dia, mês ou ano que residiram neste espaço, inscreveram os seus desejos e vontades no solo, no relevo, nas pedras, nas árvores, na vegetação, tornando-o aconchegante, verdadeiro e único, onde se sentem em casa, um espaço sem o qual não vale a pena viver e que estão constantemente a reinventar. Muitos dos habitantes saíram de Cabo Verde muito novos, cresceram aqui, construíram aqui a sua vida e é neste espaço que residem as memórias de uma vida de trabalho, e não em Cabo Verde, onde só reside saudade.

A destruição do bairro também extinguiria a produção de plantas medicinais, uma prática ativa e sustentável, que atrai muitas pessoas à comunidade. Trata-se de plantas tradicionais, muito antigas e polifuncionais, que são produzidas quase sempre em pequenos canteiros junto às suas casas, cujo conhecimento das suas valências pertence aos mais antigos. São utilizadas para tratar doenças, desde pequenas indigestões a dores na estrutura óssea e não são produzidas para comércio, não se vendem simplesmente se utilizam para tratamentos. Este conhecimento que foi trazido de Cabo Verde, sempre deu provas de eficácia e por isso muitas vezes é preferido em relação aos medicamentos convencionais. A redução do espaço, por força da pressão da construção, levou a novas formas de plantar plantas medicinais, e outras com função gastronómica ou ornamentária, com recurso a paletes de madeira, ou garrafas de plástico em suspensão fixadas nos gradeamentos das habitações, prática sustentável, difícil de observar fora do bairro.

Em certa medida os habitantes promovem a sustentabilidade do bairro cultivando estas plantas, pois trata-se de produtos medicamentosos que facilitam a vida às pessoas, não carecem de apoios financeiros para a sua produção, diminuem as idas às urgências e aos centros de saúde e consequentemente reduzem a fatura do Serviço Nacional de Saúde (SNS). São mais ecológicos e sustentáveis, e veiculam uma pesada carga da herança histórica e cultural que é conveniente preservar, como se verifica nas palavras de Meersschaert:

[…] A procura dos usos tradicionais individualizados fez emergir eventos que fogem aos mais conhecidos, aqueles que, pequenos e localizados, são a riqueza das povoações no tempo efémero das suas crenças e vontades (…), como é o caso das plantas medicinais, dependentes do clima de cada ilha, do hábito de “cantar saúde” nos casamentos e batizados, ou do Carnaval da D. Patriarca, costume de uma única família depois trazido para Portugal.84

Numa visão ética ambiental utilitarista85, encontram-se nestas plantas lucros evidentes para o Estado, e parece evidente que a demolição do bairro só ajudaria aos lóbis dos agentes imobiliários, sedentos por um espaço que é muito mais que solo, é cultura. A sustentabilidade urbana também é isso; equidade na distribuição do espaço e acesso aos recursos, tal como se tem verificado a este nível na Cova da Moura.

Todas estas iniciativas, e muitas outras não referidas, abrem a Cova da Moura ao exterior, e mostram que um espaço marginalizado pode fazer a diferença, quiçá transforma-se num polo dinâmico de irradiação de um espirito de vida com suporte em princípios de sustentabilidade. Convém salientar que a vontade de ultrapassar o estigma não faz dos habitantes pessoas arrogantes, pelo contrário, apresentam uma grande humildade, fazendo uma vida com base em valores não materiais ou monetários, mas em amor ao seu bairro e felicidade da sua família86. A Cova da Moura é hoje um dos poucos locais em Lisboa onde as pessoas se cumprimentam na rua, dando os bons dias, ou as boas tardes, mesmo não se conhecendo.

 

Figura 14: Plantação em garrafas de plástico (05/09/2013).

 

 

Considerações finais

Ao contrário do que muitas vezes é difundido pela comunicação social, de forma estereotipada, a Cova da Moura é mais do que um amontoado de barracas de madeira/ferro ou tijolo/cimento, desorganizadas e sem higiene, que servem o crime e são protegidas por miúdos traficantes, armados, de 15/18 anos. É, antes de mais, um aglomerado populacional constituído por cidadãos que procuram integrar-se na sociedade, que constituíram família, que construíram habitação, geralmente com a suas próprias mãos, que têm uma profissão e pagam impostos. São pessoas que encontraram uma forma não materialista de viver a sua vida, sustentada no amor e na felicidade, em harmonia com o cosmos, e, apesar da elevada taxa de espaços de comércio e serviços sem licença camarária, os habitantes não procuram a riqueza, somente sobreviver, o que fazem com alegria e amor87. Colaboraram no processo nacional de afirmação de identidade, num espaço de relacionamentos endémicos e enconchado, e ao mesmo tempo um espaço físico e social, propício à mobilização e circulação de recursos e informação, com mecanismos bem visíveis de solidariedade endógena.

Numa escala pequena, contudo, existe criminalidade, tráfico de droga, muita pobreza, e é necessário proceder-se de forma urgente à reordenação do território de forma a requalificar o bairro, removendo o edificado degradado, e deixando ficar o que pode ser aproveitado, de acordo com as orientações de requalificação em curso. Mas também é preciso continuar a reordenação imaterial, que passa tanto pela “dinamização de mercados específicos” (como expressão de um “empreendedorismo em territórios de pobreza e exclusão”), como pela luta contra o ódio e pela promoção da autoestima, trabalho em que as pessoas e as associações têm um papel muito importante a desenvolver.

Não existe um manual de instruções de como implementar a sustentabilidade urbana, pois é algo que tem que surgir de forma espontânea e natural e terá que ser orgânico e evolutivo. Nunca obedecerá a um rol de instruções de qualquer governo ou de qualquer construtor de modelos computorizados, “mas resultará das visões, do discernimento, da vivência e da acção de biliões de pessoas”88.

Foi assim que emergiu a revolução sustentável da Cova da Moura. A comunidade teve a “coragem e a lucidez para apresentar informação que punha em causa a estrutura de um sistema estabelecido”, altamente castrador e até ostracista, e produziu projetos que promovem a reestruturação pacífica e sustentável desse sistema, que resiste por natureza a transformações, mas que tendencialmente tem estado recetivo à nova conceção etnocultural da Cova da Moura89.

Conclui-se de forma inequívoca que a sustentabilidade urbana não é um processo impossível em territórios de pobreza e exclusão social, e só depende das pessoas, das suas atitudes e ações diárias. O sucesso dos habitantes é primeiramente resultado do amor sentido pelo espaço, da sua união, e do seu sentimento de entreajuda e colaboração com o próximo (Djunta Mo). É também fruto de uma reflexão profunda no seio da comunidade, que levou à sua corresponsabilização pela inércia na luta contra os problemas que afetavam o bairro, o que conduziu a maior parte da comunidade a adotar uma postura adequada e necessária à transformação sustentável (agency).

No processo de reconversão, o esforço dos residentes foi notável a todos os níveis, inclusive no cumprimento das normas de segurança e higiene, permitindo uma melhoria significativa na sustentabilidade económica, ambiental e social do bairro, através da criação de serviços inovadores, relacionados com o turismo étnico, com o comércio etnocultural, e com a gastronomia tradicional. O Projeto Sabura, ainda que enfatizado neste trabalho, é tão-somente uma mais-valia neste percurso, em conjunto com outros triunfos, como a elevação do Kola San Jon a Património Cultural Imaterial de Portugal (2013).

É desta forma que os habitantes têm conseguido combater o estigma de que a comunidade é alvo por parte da sociedade civil, e mitigar a degradação económica, urbanística, ambiental e social do bairro. Tal como nos refere Meadows, Meadows e Randers90, comprova-se que a transição para a sustentabilidade foi facilitada pela utilização e aplicação, cada vez mais frequente, com convicção e sem culpa, nos fluxos de informação locais, e posterior repercussão nos mundiais, das palavras: “visionar, criação de redes, veracidade, aprendizagem e amar”.

A sustentabilidade urbana, independentemente do espaço a que se refere, depende da consciencialização e agencialidade da população. Na Cova da Moura, onde foi negligenciado pelo poder estatal o planeamento e implementação de políticas e ações para o desenvolvimento sustentável, a promoção do espaço e o seu desenvolvimento harmonioso estava ainda mais nas mãos dos habitantes. Inclusive, desde sempre recaiu nestes a responsabilidade social e o fortalecimento dos mecanismos participativos e democráticos e melhor ou pior, a verdade é que tentaram. Longe de um «ecrã-estímulo», na definição de Bastos e Bastos, a comunidade e os habitantes têm vindo a produzir as suas narrativas91, que recebem um reforço positivo desta memória.

Para finalizar, reduzindo a um parágrafo todo o exposto, diríamos que a sustentabilidade é simultaneamente local (“espaço de relacionamentos endémicos e enconchado”) e global (“espaço físico e social”), decorre da efetiva mobilização de recursos e informação, ou seja, depende da produção de conhecimento, e das pessoas nas quais reside a riqueza de um país ou território.

 

Agradecimentos

Agradecemos à população da Cova da Moura, em especial à ACMJ, que a representa, pela cedência dos arquivos do Projeto Sabura. Ao Gabinete Local da Câmara Municipal da Amadora, em especial à Ermelinda Garcia, que nos acompanhou no levantamento dos espaços de comércio e serviços. Á Cristiane Fialho do Nascimento pelo apoio na recolha da informação das fichas da visita do Sabura. Aos revisores anônimos por suas sugestões.

 

Notas

2Rollnick e Naudin, 2011.

3Soczka, 2005.

4Campos e Vaz, 2013, p. 130.

5Oliveira, 2008; Mendes, 2008.

6Mendes, 2008.

7Gaspar, 1989, p. 82.

8Cabral, 1989, p. 60.

9Rodrigues, 1989, p. 80.

10Wacquant, 2012.

11Pires, 2009, p. 50.

12Costa, 2006, p. 110.

13World Commission on Environment and Development, 1987.

14AAVV., 2006c, p. 2-8.

15Maclaren, 2004.

16Braga, Freitas e Duarte, 2002, p. 3.

17Maclaren, 2004.

18Gonçalves, 1996; Morris, 1998.

19Rollnick e Naudin, 2011, p. 2.

20Limonad, 2010.

21Carapeto, 1999; Baker, Schley, Martin e Sexton, 2013 (poluição de águas e saneamento); Dodman, 2009 (transportes, uso do solo, e emissão de gases de efeito de estufa - GEE); Hoornweg, Sugar e Trejos Gómez, 2011 (forte correlação entre emissões de GEE e criação de resíduos sólidos urbanos).

22Musterd e Ostendorf, 1998; Silva, 1998, p. 133.

23Satterthwaite, 2009 (as elevadas cargas de GEE na atmosfera resultam menos do crescimento da população (urbana ou rural), e mais do consumismo, do esbanjamento, e do materialismo praticado pela população, ou seja, os problemas não são as cidades, mas das pessoas que as habitam). Wallace e Gutiérrez, 2005 (assimetria económica e no acesso aos serviços de saúde. “our work suggests that economic growth alone does not improve equity of access, and there needs to be attention focused as well on equity of access to health care” (p. 408)).

24Silva, 1998, p. 133-134.

25Stucky, 2012 (controlo social de minorias, racismo, criminalidade e violência).

26Silva, 1998.

27Dodman, 2009, p. 198-199.

28Silva, 1998.

29Leeds, 1994; Bastos e Bastos, 1999, p. 14.

30Dias, 2010a, p. 34-48.

31Costa, 2006.

32Vaz e Delfino, 2010.

33Howard, 1902.

34World Commission on Environment and Development, 1987.

35Meadows, Meadows, Randers e Behrens, 1972.

36Tietenberg, 2000, p. 4.

37Maclaren, 2004.

38Vala, 1986.

39Lessard-Hébert, Boutin e Goyette, 1990, p. 99.

40Laboratório Nacional de Engenharia Civil, 2008, p. 7.

41Com a reorganização administrativa do território das freguesias, a Cova da Moura passou a pertencer por completo à recém-criada freguesia das “Águas Livres” (Lei Nº 11-A/2013, de 28 de janeiro), freguesia que abarca a antiga Buraca, Damaia e Reboleira.

42Mendes, 2008.

43AAVV., 2006b, p. 3; CMA, 2012, p. 17.

44AAVV., 2006b, p. 3.

45Laboratório Nacional de Engenharia Civil, 2008, p. 7.

46INE, 2013.

47CMA, 2012, p. 16-17.

48Associação Cultural Moinho da Juventude, s.f.

49Antunes, 2003, p. 174-175.

50Laboratório Nacional de Engenharia Civil, 2008, p. 41.

51Clarificando Campos e Vaz (2013, p. 130), a Cova da Moura é um bairro clandestino maioritariamente de autoconstrução.

52Laboratório Nacional de Engenharia Civil, 2008, p. 11.

53Ibid, 2008, p.13.

54Campos e Vaz, 2013, p. 136.

55Campos e Vaz, 2013, p. 136-137.

56Löfgren, 1993.

57Laboratório Nacional de Engenharia Civil, 2008.

58Dias, 2010b, p. 59.

59CMA, 2012, p. 23.

60Costa, 2002, apud AAVV., 2006a, p. 3.

61CMA, 2012, p. 17.

62Procuramos uniformizar as categorias de todos os levantamentos anteriores, acrescentando as inexistentes, para permitir uma melhor comparação, e para servir de base de comparação a levantamentos posteriores. Não foram consideradas os serviços ou comércios de estabelecimentos públicos ou que funcionam com financiamento público, somente os espaços de iniciativa privada. Também não foram consideradas as vendas em rua.

63Levantamento realizado pela Associação Cultural Moinho da Juventude em março de 2002. Não publicado.

64AAVV., 2006a, p. 5-6. No texto refere 148 estabelecimentos, mas em tabela só mensura 147

65Laboratório Nacional de Engenharia Civil, 2008, p. 13.

66Levantamento e tratamento próprio, entre 9 e 16 Outubro de 2013.

67Estabelecimentos parceiros do Sabura.

68Harvey, 1990

69Costa, 2006, p. 107.

70O ano de 2003 marca a operacionalização do projeto, porque o arranque em termos de visitas presenciais quantificadas, aconteceu em março/abril de 2004, período em que, como o comprovam os registos em arquivo, estiveram presentes e fizeram a visita vários elementos representativos da comunicação social nacional (ex. Semanário África; Agência Lusa; Jornal Correio da Manhã; Jornal da Região; Rádio e Televisão de Portugal (RTP); Jornal A Capital; Jornal Expresso; Radio Mais, Jornal de Noticias, etc.).

71Costa, 2006, p. 104.

72Atente-se que, antes de criado o projeto Sabura, já a ACMJ desenvolvia contactos sob a forma de visitas a grupos de pessoas, escolas, associações e outras que mostravam interesse em conhecer o Bairro e os projetos aí desenvolvidos, e que não estão plasmadas no gráfico alusivo ao número de visitas. Aliás, neste gráfico só estão contabilizadas as visitas que receberam feedback através do preenchimento manuscrito da ficha de visita.

73As visitas tinham um custo unitário de 5 euros, agora reduzido para 2,5 euros.

74Manifestação musical cabo-verdiana.

75Vaz e Delfino, 2010.

76Costa, 2006, p. 104.

77Costa, 2006.

78Costa, 2006, p. 104.

79Anúncio n.º 323/2013. Inscrição do “Kola San Jon” (Bairro do Alto da Cova da Moura, Amadora) no Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial. Diário da República, 2.ª série — N.º 200 — 16 de outubro de 2013.

80Campos e Vaz, 2013, p. 132.

81Diener e Oishi, 2000; Zidanšek, 2007, p. 896.

82Mollison, 1990.

83Meersschaert et al., 2008, p. 44.

84Meersschaert et al., 2008, p. 43.

85Vaz e Delfino, 2010.

86Diener e Oishi, 2000; Zidanšek, 2007, p. 896.

87Diener e Oishi, 2000; Zidanšek, 2007, p. 896.

88Meadows, Meadows e Randers, 1993, p. 240.

89Ibid, p. 242.

90Ibid.

91Bastos e Bastos, 1999.

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Fecha de recepción: 26.02.13
Fecha de aceptación: 05.05.14